Já vimos a parábola de Lázaro e o homem rico no contexto da vida após a morte. Desta vez, vejamos quais os nove castigos da pobreza de acordo com São João Cristóstomo, que se apoia na mesma parábola:
(1) Pobreza. É algo verdadeiramente
terrível pois nenhuma palavra consegue descrever a grande angústia que e
suportada por aqueles que vivem como mendigos sem conhecer a sabedoria [aqui o
santo provavelmente se refere ao desconhecimento da causa final da pobreza e do
sofrimento, ou eja, a falta de sabedoria implica numa visão horizontal da
pobreza].
(2) Doença. Muitos adoecem com frequência
sem que lhes falte o necessário para a subsistência. Outros vivem em extrema
pobreza, mas desfrutam de boa saúde. Um bem se torna um consolo para o outro
infortúnio. Mas aqui os dois infortúnios se apresentaram juntos.
(3) Solidão. Mesmo se não está na própria
casa, pelo menos em público [Lázaro] poderia receber a piedade daqueles que o veem.
Para Lázaro, porém, a ausência de protetores tornou seus dois infortúnios ainda
mais dolorosos.
(4) Desencorajamento. A ausência de
protetores tornava-se ainda mais dolorosa ao se encontrar diante da porta da
casa do rico. Ele passou a sentir uma aflição mais aguda.
(5) Percepção mais aguçada dos
infortúnios. Além de tudo isso, Lázaro tinha diante de seus olhos o
espetáculo de um homem rico e bem afortunado. É da nossa natureza compararmos
nossa situação com a prosperidade alheia. O rico se saía bem em todos os aspectos,
apesar de viver com crueldade e desumanidade, enquanto Lázaro, vivendo com
virtude e bondade, sofria terríveis infortúnios. Era como se tivesse vindo ao
mundo com esse exato propósito, para ser testemunha da boa fortuna alheia.
(6) Isolamento espiritual. Lázaro
não podia observar outro Lázaro. Mesmo se sofremos de uma infinidade de
problemas, ao contemplar Lázaro podemos pelo menos obter algum consolo e encorajamento.
Encontrar quem partilha das mesmas misérias, em histórias ou em fatos, traz um
grande consolo aos que vivem em aflição. Mas ele não encontrava ninguém com
sofrimentos semelhantes aos seus.
(7) Achatamento existencial. Lázaro
não podia encontrar consolo na ideia da ressurreição. Acreditava que tudo se
resumia à vida presente, pois encontrava-se entre aqueles que precederam o
tempo da graça. Não podia praticar tal sabedoria.
(8) Calúnia. A maioria das pessoas
julga a vida do outro por suas dificuldades e acha que foi a iniquidade, sem dúvida,
a causa de tanta miséria. Dizem entre si muitas tolices. Por exemplo, se Lázaro
fosse amado por Deus, Deus não teria permitido que sofresse na pobreza nem se
submetesse a tantos infortúnios.
(9) Extensão temporal. Lázaro
suportou sua pobreza uma vida inteira, não apenas um ou dois dias.
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Mesmo quando não buscamos a virtude talvez
sejamos capazes de obtê-la se pelo menos a louvarmos. E mesmo quando não evitamos
o mal, talvez sejamos capazes de escapar dele se pelo menos o censurarmos.
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Verdade seja dita, o rico não é aquele que
reuniu muitos bens materiais, mas aquele que precisa de pouco. E o pobre não é
aquele desprovido de bens, mas aquele que a tudo cobiça.
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O rico costuma ser o mais pobre de todos.
Se retirardes a máscara, abrirdes a consciência e entrardes na mente,
encontrareis uma grande pobreza de virtude: descobrireis que ele pertence à
classe mais baixa de todas.
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Realmente também é roubo não compartilhar
as posses. [...] Os ricos guardam os bens dos pobres mesmo se foram herdados
dos pais ou adquiridos de qualquer outra forma. [...] É por isso que Deus
permitiu aos ricos ter mais: para ser distribuído a quem necessita. O homem
rico é uma espécie de intendente do dinheiro que deve ser distribuído aos
pobres.
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Um juiz é uma coisa, um benfeitor é outra. A caridade recebe este nome porque é praticada mesmo com os indignos. Façamos o mesmo, eu vos imploro, sem mais questionamentos do que o necessário. O valor do homem pobre está apenas na sua necessidade. [São João Maximovitch, por exemplo, foi visto vários vezes dando esmola a um notório bêbado. Questionado por que o fazia, dado que o dinheiro certamente seria gasto para sustentar seu vício, o santo respondia que ele não era melhor que o homem bêbado. Em outras palavras, o valor de ambos, santo e bêbado, reside na natureza humana, que lhes é idêntica. A transmissão da bondade pelo benfeitor, mesmo diante de uma "má necessidade", está acima da indignidade do vício. Eis a autêntica filantropia: amor e compaixão pelo próximo, a despeito de quem seja. Uma magnanimidade incomum, sem dúvida].
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É um grande bem ter vossas esperanças de
salvação depositadas em vossos próprios atos virtuosos.
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Quando somos testados em circunstâncias
difíceis, lembramo-nos dos antigos pecados.
Fonte: São João Crisóstomo, A riqueza e a pobreza, Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro, RJ, Brasil, 2022.