O objetivo de Mortimer J. Adler em Art, the Arts, and the Great Ideas é responder a seguinte pergunta: a música, a pintura, o balé, enfim, todas as artes que não estejam associadas com palavras, podem ensinar ou adicionar conhecimento às Grandes Idéias?
A título de introdução, Adler lembra que, no livro VI de Ética a Nicômaco, Aristóteles distingue cinco virtudes intelectuais:
A) Saber para saber (virtudes especulativas)
1) Noûs (insight)
2) Episteme (em latim, scientia)
3) Sophia (sabedoria especulativa ou filosófica)
B) Saber para agir (virtudes práticas)
4) Phronesis (prudência ou sabedoria prática) -> praxis (conduta moral ou política)
5) Techné (arte, técnica, habilidade -> poiesis (fazer algo, produzir, desempenhar)
Na esfera da poiesis, que é a que nos interessa, Platão distingue entre artes cooperativas (agricultor, médico, professor) e artes operativas (todas as demais). Ainda na esfera da poiesis, Aristóteles distingue entre as artes liberais (operadas com o intelecto, ou seja, o artista opera com símbolos e pode existir em qualquer lugar) e as artes servis (operada com materiais e só existe em um lugar). Neste caso, observa-se que há uma diferença ontológica, e não social, entre estas artes.
Há ainda outra distinção identificada por Aristóteles: (1) narrativa poética, que opera na região do provável e do possível e, portanto, não é exclusivista (verdade poética) e (2) narrativa histórica, que opera na região do factual e do actual e, portanto, é exclusivista (verdade lógica).
Em seguida, Adler afirma que a intenção do artista e de quem contempla a obra de arte não têm relevância para as belas-artes. Isso significa que por mais que o artista afirme que a obra de arte se conforma à idéia criativa que está em sua mente, ele terá manifestado uma verdade ontológica entre a obra de arte e si próprio. Ocorre que nosso interesse reside apenas na verdade lógica (factual) e na verdade poética (possível) das obras de arte, pois somente elas podem conter alguma instrução útil às Grandes Idéias.
Adler continua sua explanação relembrando o leitor sua doutrina dos signos. Há dois tipos de signos: os signos verbais (palavras) e os não-verbais. As palavras podem ser designadoras ou signais. Enquanto designadoras, elas dão nome às coisas; enquanto signais, elas elicitam comportamentos (como a palavra "fogo", quando gritada no interior de um cinema lotado, faz todos saírem correndo). Os signos não-verbais, por sua vez, também podem ser designadores (as representações simbólicas de banheiro masculino e feminino, por exemplo) ou signais (como as nuvens no céu, que signalizam chuva iminente).
A notação, por sua vez, é uma marca visível ou um som audível. As notações, embora perceptíveis, não possuem em si nenhum significado. Então, cabe a pergunta: de onde vem o significado que transforma uma notação em uma palavra? As palavras designam objetos, assim como trazem à mente determinado conteúdo. Elas funcionam, portanto, como signos instrumentais. No entanto, existem signos designativos cuja única função é de significação. São os signos formais. Assim, os signos instrumentais são objetos que apreendemos, mas os signos formais não: eles são os conteúdos mentais cognitivos, são os atos da imaginação (ou "imaginação intelectual"). As palavras que empregamos só têm significado como signos instrumentais quando se associam a signos formais.
Ora, os atos mentais são apreensões de percepções, memórias e imaginações, que combinam a ação das potências sensitivas e intelectivas, ou então são atos puramente intelectivos. Assim sendo, as obras de arte nunca carregam pensamentos puramente intelectuais, pois sempre dependem das potências sensitivas. A exceção a esta regra cabe à literatura, que pode perfeitamente carregar conceitos puramente intelectuais.
Por fim, cabe lembrar que as Grandes Idéias não fazem parte do conteúdo cognitivo de nenhuma mente humana, ou seja, elas não são memórias, nem imaginações, nem constructos teóricos, nem os conceitos que estão em nossas mentes. Elas também não são signos formais, ou seja, também não são as intenções mentais que são significados e que servem para colocar os objetos significados diante da mente. Em suma, elas não são id quo (aquilo por meio do que) pensamos, mas são id quod (aquilo que) pensamos: são, pois, objetos de pensamento.
As obras musicais e as obras de arte visuais não contribuem significativamente para as Grandes Idéias, pois o meio em que são produzidas é próprio dos sentidos. Sua linguagem consiste em símbolos não-verbais, e por isso atuam no pensamento perceptual, e não no pensamento conceitual.
A conclusão é que estas obras de arte têm função emocional, sentimental, pois impactam e influenciam a imaginação. É somente neste sentido, deveras limitado, que elas influenciam as Grandes Idéias. Claro que, além disso, elas também transmitem prazer estético. As obras literárias, antes de nos mover emocionalmente, têm de ser interpretadas intelectualmente. Por isso, no caso delas, podem, sim, contribuir para as Grandes Idéias.
Ilustração: trecho inicial da Sinfonia nº 36 em Dó Maior, K. 425, "Linz", de Wolfgang Amadeus Mozart.