15 de fevereiro de 2011

Evágrio Pôntico


Pe. Gabriel Bunge

Enquanto estudava as obras de Santo Isaque de Níneve (da Síria), compreendi que os Padres foram inspirados pelas obras de Evágrio Pôntico. Decidi aprender mais sobre ele, estudei o idioma siríaco e conclui que há muitos preconceitos contra ele. O fato é que o Quinto Concílio Ecumênico não o condenou pessoalmente, mas apenas em relação aos origenistas. Desde então, decidiu-se que ele era origenista e coisas impossíveis foram atribuídas a ele.

Quando falo deste assunto com alguém, digo o seguinte: “Evágrio é acusado de estar em desacordo com quase todas as doutrinas da cristologia ortodoxa. Tudo bem, mas você não acha estranho que São Basílio, o Grande, não tenha notado nada disso nele? E Gregório, o Teólogo não notou nada também. Ademais, Teófilo de Alexandria queria ordená-lo bispo (Evágrio escapou dessa). Até mesmo antiorigenistas (Epifânio de Chipre, Hierônimo) jamais acusaram Evágrio de nada, embora o conhecessem pessoalmente. Será que não somos nós que estamos enganados?”

Foi então que comecei a estudar Evágrio com a devida seriedade. A oitava carta de São Basílio, o Grande, é tradicionalmente atribuída a São Basílio, mas sem sombra de dúvida foi escrita por Evágrio. A carta contém todos as doutrinas de Evágrio. Isso significa que Evágrio sempre pode ser lido com lentes ortodoxas. No entanto, ele também pode ser lido de maneira heterodoxa. A questão está no método. Eu também poderia mencionar “Da Oração”, conhecida como de autoria de Nilo de Ancira. Colocou-se nomes de Santos Padres ortodoxos nas obras de Evágrio para salvá-las e para que fossem lidas de maneira ortodoxa. É perfeitamente possível ler as obras dele sob a perspectiva ortodoxa. Eu aprecio Evágrio exatamente sob este ponto de vista.


Nota: As conclusões do Pe. Gabriel são semelhantes mutatis mutandis às do Metropolita Hieroteu de Náfpaktos quanto a São Gregório de Nissa. Ele explica no capítulo 8 de seu livro Life After Death que São Gregório não absorveu a doutrina da palingênese de Orígenes, ou seja, a doutrina da reencarnação (pág. 274). Afinal, São Gregório era um homem deificado, reconhecido por outros santos como tal – ele era tido como "o Padre dos Padres" pelos Concílios e um dos “Padres Capadócios” –, criador da forma final do Credo acerca do Espírto Santo etc. Em suma, como pode alguém que formula dogmas nucleares da fé cristã, de repente, em questões afins, simplesmente ensinar uma heresia grosseira e, por fim, ser aceito como "Padre dos Padres" por muitos santos de elevada estatura espiritual? Não é possível que São Gregório tenha se enganado, mas é muito mais provável, segundo o Metropolita Hieroteu, que seus críticos estejam enganados a respeito dele.

São Máximo, o Confessor, reconhece que São Gregório de Nissa exagerou nesse ponto. Mas é só isso: exagero na exposição. Esse seria o “erro” de São Gregório: exagerar, expressar-se mal, falhar na exatidão da explicação. Mas a explicação (a língua humana), em si, já foge do domínio da verdade incriada propriamente dita, e entra no âmbito das coisas criadas e, portanto, transitórias e imperfeitas.

Imagem: Evágrio Pôntico, pintado pelo iconógrafo Giorgos Kordes.