28 de outubro de 2010

A psicoterapia na Igreja


Entre as pessoas que não estão espiritualmente saudáveis contam-se também certos sacerdotes que estudam psicologia para curar as almas das pessoas (com conhecimentos humanos). O mais estranho neste fenômeno é que seus mestres, os psicólogos, não acreditam em Deus nem aceitam a existência da alma; quando acreditam, o fazem à sua própria maneira (quase todos eles). Estes sacerdotes acabam revelando, pelas suas ações, que estão espiritualmente doentes e que precisam de exame patrístico. Após serem curados, eles mesmos conseguirão discernir este espírito maligno ao mesmo tempo em que chegarão ao conhecimento da graça divina. A partir daí, eles usarão a eneregia divina ao invés das artes humanas para curar as almas sofredoras.

19 de outubro de 2010

A arte da periagoge


Segundo John von Heyking, Gerhart Niemeyer e Eric Voegelin adotavam em suas aulas de filosofia política uma técnica para provocar em seus alunos a periagoge platônica, ou seja, o giro da alma em direção ao fundamento divino, afastando-a da indolência espiritual. Essa arte, que é a autêntica “educação liberal”, vem originalmente de Kierkegaard. A função não é apenas transmitir conceitos e descrições das sociedades e ideologias, os quais apelariam para uma porção pequena da alma do aluno, mas provocar uma verdadeira conversão existencial, algo mais amplo e profundo, que efetivamente desperte o aluno e faça-o voltar-se para a busca da verdade.

A arte da periagoge divide-se em três fases:

1) Fase estética. O professor procura despertar a conversão no aluno mediante a sátira e a ironia. Por exemplo, Voegelin, em Hitler e os Alemães, ironiza os expoentes da intelectualidade e da moralidade da sociedade alemã dos tempos nazistas tomando emprestadas algumas sátiras de Karl Kraus. A idéia não é intimidar os alunos ali presentes ou insultar gratuitamente os intelectuais mencionados, mas provocar uma mudança no senso estético dos alunos a fim de que enxerguem as pessoas pretensamente grandes como realmente são, ou seja, pequenas e desprezíveis.

2) Fase ética. O professor procura converter o aluno em duas perspectivas: (a) expressando indignação moral e (b) afirmando a ordem moral como sendo um elemento essencial para o entendimento científico da realidade política. Um dos exemplos utilizados por Voegelin é o do jornalista que critica um prisioneiro de Auschwitz por ter chamado um dos guardas de “assassino”, apesar de o guarda apenas o ter deixado aleijado. A indignação de Voegelin para com o jornalista é patente. Quer dizer que só devemos chamar alguém de “assassino”, mesmo após vê-lo matando alguém a frio, depois de o indivíduo ser julgado como tal em um tribunal? A mentalidade legalista do jornalista o impede de falar a verdade por receio de violar a letra da lei.

3) Fase religiosa. É a “conversão ao transcendente”. Se a fase anterior julgava moralmente as ações do indivíduo, nesta fase o indivíduo é julgado como um todo perante os padrões da ordem transcende. Isso significa que o professor deve apontar a perda de realidade, que invariavelmente encontra-se no desejo do indivíduo de ser o criador de sua própria existência e de seus próprios valores. Ao mesmo tempo, o professor tem de explicar ao aluno qual é o padrão empiricamente verdadeiro da ordem transcendente. A este respeito, em Hitler e os Alemães, Voegelin diz: “As experiências da razão e do espírito deixam claro que o homem experiencia-se como um ser que não existe de si mesmo. Ele existe em um mundo que lhe é dado de antemão. A existência deste mundo é um mistério, e o nome deste mistério, da causa do ser do mundo, do qual o homem é um componente, chama-se ‘Deus’. Portanto, a dependência da existência da causação divina da existência é, e sempre tem sido, a discussão básica da filosofia”. Trata-se de um chamado existencial profundo, e não apenas um chamado para sustentar opiniões e conceitos aprovados pela religião. É por isso que Voegelin criticou duramente o papel desempenhado pelas igrejas protestantes durante o período nazista: embora seus líderes se mantivessem fiéis aos dogmas e conceitos de suas igrejas, recusaram-se a prestar testemunho à verdade transcendente.

Por fim, Heyking explica que estas fases não são temporais, ou seja, elas ocorrem alternadamente e mesmo simultaneamente. Não devem, portanto, ser encaradas de maneira isolada.

17 de outubro de 2010

O filósofo-místico de Eric Voegelin


Das várias introduções ao pensamento de Eric Voegelin, a de Michael P. Federici é uma das mais interessantes e concisas, além de amplamente reconhecida por seu mais famoso discípulo, Ellis Sandoz. O objetivo deste artigo é delinear, em linhas bem gerais, as doutrinas de Voegelin sobre o papel civilizacional da filosofia e do filósofo, bem como alguns aspectos de sua filosofia da consciência.

Em termos simples, Voegelin entende que o colapso em que se encontra o mundo, sobretudo o Ocidente, é fruto da perda da consciência de experiências históricas vitais para a ordem política, social e existencial. São essas experiências históricas, juntamente com seus símbolos linguísticos correspondentes, que iluminam a verdade da realidade. Neste quadro desolador, as ideologias lograram êxito mediante a deturpação desses símbolos, usurpando-os e desconectando-os de suas experiências originais. A tarefa do filósofo é, portanto, reconquistar em sua própria consciência as "experiências desencadeantes" (engendering experiences), recapturando a verdade da realidade (o ground of being) que vive concentrada em símbolos. Isso significa que os símbolos linguísticos do mito, da revelação, da história e, acima de tudo, da filosofia, devem ser reativados antes de quaisquer debates políticos mais profundos. Em outras palavras, a tarefa do filósofo é reproduzir imaginativamente o significado dos símbolos mediante atos meditativos, criando, assim, "símbolos reflexos" que articulem a verdade contida nos "símbolos originais".

Há dois aspectos importantes no que acabo de dizer: (1) o objetivo da filosofia é muito mais ousado do que o mero estudo da realidade e das principais idéias que a descreveram ao longo da história, e (2) o filósofo voegeliniano não é um simples intelectual, mas um místico. Mas como é isso? Como opera exatamente esse filósofo?

A restauração da consciência às experiências da ordem exige por parte do filósofo uma abertura total para a busca existencial (zetema) da fonte divina dessa ordem. Trata-se de um processo de recordação (anamnesis) daquilo que permanece dormente na mente ocidental e que aguarda ser imaginativamente despertado pela alma espiritualmente sensível do filósofo. A exemplo de Platão, Voegelin acredita que somente "almas ordenadas" seriam capazes de restaurar a ordem política e social. Não se trata de mera recuperação dos símbolos e das experiências históricas da transcendência, mas uma reatuação meditativa, uma imitação mesmo, das experiências espiritualmente substanciosas que motivaram as evocações simbólicas do passado. Assim, a anmnesis não é uma restauração literária, ou seja, não se trata de estudar os Great Books, que é algo que pode ou não ser relevante. Portanto, a filosofia política não é o estudo da história das idéias políticas, pois isso seria uma deformação ideológica da realidade: a filosofia é a verdadeira "luz da sabedoria" que recompensa o esforço do filósofo em localizar as forças do mal e identificar sua natureza. O filósofo é um grande herói, um homem de extrema coragem, que luta em meio à sociedade desordenada a fim de restaurar a ordem. O estudo da história é relevante apenas enquanto alimento para estimular o filósofo na busca pela ordem. A educação, acredita Voegelin, é a arte platônica da periagoge, ou seja, é o giro da alma em direção ao fundamento divino ao mesmo tempo que a afasta da indolência espiritual e da desolação do mundo.

Voegelin segue o método aristotélico de ciência política. Tudo começa com o filósofo analisando os símbolos auto-interpretativos de sua sociedade em particular -- "justiça", "felicidade" e "cidadão", por exemplo. Uma vez que estes símbolos tenham sido compreendidos, o próximo passo é medi-los contra os símbolos linguísticos do próprio filósofo. Não raro, o filósofo perceberá que vive fora de sintonia, como que em tensão, com essa sociedade. Platão, por exemplo, seria um filósofo voegeliniano. Ele percebeu com clareza as fraquezas da sociedade ateniense, procurando retificá-las em sua própria alma. Cícero, por outro lado, é um contra-exemplo de filósofo voegeliniano. Ele não identificou as fraquezas de Roma porque a considerava o estado ideal. Assim, a tarefa precípua do filósofo é criar uma tensão entre a ordem da sociedade e a ordem de sua própria alma, sendo que a restauração da ordem depende da capacidade do filósofo em tocar as consciências das outras pessoas ao nível do pathos (apelo mediante a "ternura" ou "compaixão"). É por isso que Voegelin prescreve que recuperemos as experiências de ordem e transcendência. No nível da experiência, reside uma percepção da realidade que é muito mais difícil de ignorar do que a verdade contida em proposições e dogmas. Para que as almas movam-se em direção ao Agathon (ou summum bonum escolástico), o spoudaios (filósofo, o "homem maduro" aristotélico) tem de confrontar as almas desordenadas de forma a vencer sua resistência à busca pela realidade transcendente, ou seja, sua logophobia, e passem a cultivar o desejo de buscar a ordem e a verdade mediante sua participação no nous divino.

Além da filosofia, um dos instrumentos mais importantes para a restauração das experiências desencadeantes na consciência são os mitos. Os mitos ajudam a manter vivas e vibrantes as experiências com a realidade transcendente. É o caso dos mitos da Criação, de Noé e o Dilúvio e da Torre de Babel, nas quais o conteúdo das histórias não é o importante, mas as experiências ali simbolizadas. Os mitos são frequentemente resultado de experiências de revelação divina, como foi o caso com Moisés ou Isaás.

Esta observação nos leva a uma questão importante. Voegelin considera que a diferenciação que ocorre após a experiência desencadeadora, ou seja, os novos insights que se acumulam com o processo histórico, é um fenômeno que ocorre tanto com as revelações quanto com a filosofia. Isso significa, embora não o diga explicitamente, que os simbolismos da revelação e da filosofia são, de certa forma, equivalentes.

A filosofia da consciência é um importante elemento na compreensão do pensamento de Voegelin. A consciência é a área da realidade onde o intelecto divino (nous) move o intelecto humano (nous) a empenhar-se na busca pelo ground of being. Os seres humanos estão em busca (zetesis) do divino, e esta busca é engendrada por uma atração (kinesis) do divino. Este processo caracteriza-se pela mútua participação, a qual Aristóteles chama de metalepsis. Voegelin acredita que o desenrolar da história é precisamente o desenrolar da estrutura da consciência. No entanto, Voegelin sabe que uma sociedade corrompida por ideologias interporá inúmeros obstáculos para aceitar a história do filósofo; porém, todo ser humano possui, em sua consciência, a presença do divino, e é precisamente este elemento comum entre a consciência do ouvinte e o divino presente na história do filósofo que o filósofo buscará despertar.

* * *

É impossível que o leitor cristão ortodoxo não fique ressabiado com os ensinamentos e descobertas de Eric Voegelin. Sua doutrina da representação imaginativa de experiências passadas, a fim de reativar os símbolos originais mediante símbolos reflexos, é, no mínimo, suspeita. Um dos ensinamentos básicos dos Santos Padres, da Philokalia e demais autores místicos, é precisamente neutralizar e esvaziar a imaginação de elementos externos e internos a fim de se alcançar a theosis. Não é, claro, a única recomendação, mas é uma das recomendações centrais. Padres dedicaram capítulos e homilias inteiras apenas neste aspecto. A imaginação, segundo a doutrina cristã ortodoxa, é resultado da Queda, e o monge ou "filósofo" que busque a ascese em direção a Deus deve aprender a esvaziá-la dos logismoi. Do ponto de vista da Ortodoxia, Voegelin aponta um caminho perigosíssimo para seu ground of being.

Além disso, a filosofia parece ser elevada a uma condição quase fantástica. A Igreja nunca foi contra a filosofia. Pelo contrário, muitos Padres guardavam grande respeito por ela. São Gregório Palamás ensinava como utilizá-la para benefício do cristão. São Basílio, tido como mais inteligente que Aristóteles, fez uso intenso de conceitos platônicos, aristotélicos e estóicos. Recentemente, basta citar a grande admiração que São Nicolau Velimirovich nutria pela filosofia. Recomendo a leitura de Orthodoxy and Philosophy. No entanto, não há espaço na antropolgia e psicologia ortodoxas para o contato direto de filósofos, pelo exercício da consciência em atos imaginativos, com o incriado. Tal empresa, desprovida da purificação prévia segundo o método ortodoxo, abre o indivíduo, na melhor das hipóteses, para auto-ilusões, e na pior, para influências demoníacas.

Voegelin é mesmo um filósofo facinante. No entanto, creio ser prudente que o estudioso de suas obras analise-as à luz da tradição sempre que perceber que a filosofia está invadindo o campo próprio da teologia.

15 de outubro de 2010

Dialética


Poucos estudantes do filósofo americano Mortimer J. Adler leram seu primeiro livro, publicado quando o autor contava com apenas 25 anos de idade. Em Dialectic, Adler pretende estabelecer as bases daquilo que entende ser a dialética e, mais ousadamente, daquilo que entende ser a atividade essencial da filosofia. É este livro, como muitos anos mais tarde confessou, que contém os princípios e as motivações que levaram Adler a fundar o Institute for Philosophical Research, a criar o Syntopicon e a reunir os Great Books em uma abrangente coleção. No entanto, também em sua autobiografia, Adler menciona rapidamente por que discorda da conclusão fundamental de Dialectic. Ao final deste artigo, vou procurar explicar quais seriam os motivos que fizeram o Adler Sr. discordar do Adler Jr., segundo meu próprio entendimento do pensamento deste autor.

Introdução

Alguns conceitos populares a respeito do que vem a ser "pensamento" precisam ser revisados antes de adentrarmos no assunto dialética.

A literatura popular acerca da dialética apresenta, em linhas gerais, quatro postulados fundamentais. Vamos enunciá-los para que, em seqüência, façamos alguns comentários corretivos.

(1) "O pensamento é um processo que se resume a possuir e lidar com idéias".

Segundo este ponto de vista, as idéias seriam imagens mentais, proposições, julgamentos ou mesmo pensamentos sem imagens. No entanto, duas correntes científicas recentes sofisticaram estas noções: o behaviorismo e a lingüística. Em linhas gerais, o que estas correntes científicas nos ensinam é que a linguagem desempenha um papel fundamental no processo de pensamento. Portanto, a tese deve ser reescrita da seguinte forma: o pensamento é um processo que se resume a possuir e lidar com idéias mediante a linguagem. Infelizmente, a partir do século XVI, a teoria do pensamento começou a desprezar a relevância da linguagem, da gramática e da retórica.

(2) "O pensamento é um processo empreendido individualmente".

Não é verdade, pois o pensamento também pode ser empreendido pelo processo interativo de duas mentes. Este processo interativo não segue necessariamente a estrutura canônica formal do pensamento lógico indutivo e dedutivo.  Platão foi quem originalmente cunhou o termo "dialética", que é precisamente o termo que designa esse pensamento discursivo e conversacional. Ademais, cabe observar que a criança, ao longo de seu processo de desenvolvimento mental e linguístico, aprende, em primeiro lugar, a usar a linguagem para comunicar seus desejos e necessidades ao ambiente social que a envolve. Somente mais tarde é que esta criança começará a utilizar seu vocabulário para propósitos a-sociais e inteligentes. Isso significa dizer que, embora o pensamento a-social seja mais sofisticado e, neste sentido, superior, a comunicação verbal é um tipo próprio de pensamento, a qual a dialética, mais tarde, procurará torná-la mais elaborada e precisa. Vê-se, assim, que o pensamento lógico não é uma sofisticação da comunicação verbal, mas um tipo diferente de pensamento. A dialética, conforme Hegel deixou claro, não exige uma dualidade de mentes, mas apenas uma oposição, um conflito, que pode perfeitamente existir dentro de uma só mente.

(3) "O pensamento é uma atividade racional, indepente de propósitos e desejos irracionais".

Na verdade, as recentes pesquisas em psicologia dizem precisamente o contrário: o pensamento é uma atividade muito mais ligada à racionalização do que ao raciocínio. Racionalizar significa enxertar razões às conclusões, crenças e opiniões já previamente sustentadas pela pessoa. É a isto que chamamos de preconceito, complexo emocional, desejo inconsciente. Há três fontes de irracionalidade que se escondem por trás das racionalizações: (a) o desejo de convencer o oponente, cuja polêmica sempre envolve partidarismos, (b) fontes supra-cognitivas, como fé, intuição ou outra forma de insight cujas proposições não possam ser submetidas ao escrutínio da razão, e (c) falta de insight, ou seja, bloqueios emocionais que compelem a pessoa a rejeitar determinada proposição. No entanto, a psicologia não é o único campo de conhecimento que rejeita a tese de que o pensamento é uma atividade puramente racional. Platão ensinava que o argumento, seja ele qual for, sempre se move dentro dos limites estabelecidos por hipóteses e definições que, por sua vez, não podem ser submetidas ao escrutínio do próprio argumento. Isso significa dizer que toda demonstração lógica, seja um argumento ou um sistema, depende de uma série de premissas -- postulados, definições e indefiníveis -- que não podem, por princípio, ser submetidas ao processo de demonstração. Tais premissas são os equivalentes, no campo da psicologia, aos preconceitos e wishful thinkings, ou seja, são elementos escolhidos, selecionados, e não elementos intelectualmente obrigatórios e racionalmente inevitáveis; são "proposições intuitivas", no sentido de que são proposições escolhidas como sendo verdadeiras, mas não necessariamente verdadeiras.

(4) "O objetivo do pensamento é o conhecimento, ou seja, o pensamento busca sempre a verdade".

Há, genericamente falando, três grandes tipos de pensamento: o pensamento empírico, o pensamento matemático-geométrico e o pensamento dialético. A diferença entre o pensamento empírico e o pensamento matemático-geométrico é que o pensamento empírico submete seus processos racionais ao julgamento de critérios extrínsecos, isto é, de fatos e experiências, enquanto o pensamento matemático-geométrico submete seus processos racionais ao julgamento de critérios intrínsecos, isto é, de consistência, demonstração etc. No caso do pensamento empírico, a veracidade é controlada por entidades que estão para além do processo, enquanto no pensamento matemático-geométrico a veracidade é controlada por entidades que se encontram dentro dos limites do próprio pensamento. O pensamento matemático-geométrico bem poderia ser chamado de "pensamento se-então", já que seu processo obedece a um padrão do tipo "se isso, então aquilo", ou seja, dadas estes postulados, então aquelas proposições são verdadeiras: a veracidade dos postulados é meramente hipotética, enquanto a veracidade das proposições depende das regras de demonstração e inferência e, claro, supondo-se que essas regras sejam, em si, verdadeiras, o que, a rigor, é impossível de se demonstrar. Ora, se o pensamento empírico não é capaz, por si só, de alcançar a verdade, e o pensamento matemático-geométrico, mesmo sendo "consistente", também não poderia fazê-lo, menos ainda o pensamento dialético o será. O pensamento dialético não busca a verdade, mas a concórdia. Os lados podem estar de acordo, após uma disputa argumentativa, mas isso não significa que possamos dizer que alcançaram a verdade -- bem poderá ter ocorrido o contrário, ou seja, ambos poderão estar terrivelmente engandos em meio à sua concórdia. Os fatos interrompem a dialética, pois introduzem um elemento estranho a ela. Por isso, de certa maneira, podemos dizer que o pensamento dialético é mais semelhante ao pensamento matemático-geométrico, pois sua veracidade também está mais ligada a elemetos de consistência e demonstração.

Conceitos importantes

Vamos, então, procurar expandir e elaborar melhor as controvérsias que mencionamos. O pensamento empírico e o pensamento matemático-geométrico já foram suficientemente elucidados ao longo dos últimos séculos. É o pensamento dialético que precisa ser melhor elaborado. A Antiguidade e a Idade Média bem que apreciaram a importância da dialética, mas é importante agora, nos tempos modernos, retomá-la à luz dos comentários mais recentes da ciência e da experiência.

Mas, antes de elaborá-las, vamos enunciar, de maneira mais ou menos arbitrária, quais são as principais características da dialética:

(1) A dialética surge a partir da confusão e da contradição de significados em um discurso.

(2) A dialética é uma forma de pensamento que não pode ser completamente caracterizada pelas regras da indução e da dedução. Isso significa que a dialética depende de uma situação intelectual na qual os processos de indução e dedução são irrelevantes, que, em verdade, são técnicas de investigação e demonstração mais apropriadas para as ciências naturais e para a geometria, respectivamente. A situação intelectual de interesse da dialética é a resolução de oposição de opiniões.

(3) As controvérsias dialéticas nunca são puramente racionais ou intelectuais. A persuasão emocional, as limitações e excentricidades de entendimento e interpretação e os propósitos que controlam a vida prática e teórica são também responsáveis pela geração das disputas e dificuldades que gravitam em torno das opiniões e convicções das pessoas.

(4) Nenhum argumento é capaz de definir todos os seus termos, ou seja, os argumentos sempre fazem suposições implícitas e/ou explícitas. É por isso que a dialética preocupa-se com a exposição mais exata possível dos postulados e com as definições dos termos do discurso.

(5) O partidarismo é algo inevitável mesmo quando estão disponíveis opções genuinamente intelectuais. No entanto, se o praticante da dialética perceber que a disputa surgiu porque as definições e suposições foram arbitrariamente escolhidas, deve renunciar a seu partidarismo e adotar uma postura imparcial.

(6) A dialética é uma atividade ligada ao discurso, à controvérsia, ao argumento. A dialética ocupa-se somente dos significados das entidades de discurso e, portanto, não pode estabelecer verdades que dependam da relação entre o discurso e itens que não estejam no discurso. Portanto, fatos jamais devem ser introduzidos no processo. Disputar um "fato" significa que houve um mal-entendido quanto à realidade desse fato ou significa que houve uma diferença de opinião quanto ao significado deste fato no argumento em questão -- neste último caso, o pensamento discursivo se aplica, pois aí a realidade do fato é assumida como verdadeira.

(7) A dialética não busca a verdade, nem é capaz de alcançá-la. O partidarismo e a imparcialidade exigidos no processo dialético impedem que o praticante da dialética assuma a postura de que tenha alcançado uma "verdade".

Após observarmos os discursos, as controvérsia e as "conversas" que ocorrem entre as pessoas, podemos enunciar as seguintes observações:

(1) A dialética é, em parte, um processo de definição; por meio da definição, a dialética procura esclarecer a controvérsia.

(2) A dialética é, em parte, um processo de detecção de oposição entre suposições e definições; a dialética procura resolver esta oposição formulando uma terceira série de proposições que inclua as proposições conflitantes.

(3) A resolução do conflito só é possível dentro de um mesmo universo de discurso; a resolução ocorre quando dois universos de discurso díspares são unificados, ou seja, quando é possível a tradução entre eles.

(4) Os conflitos dialéticos resumem-se a oposições discursivas, sejam proposições dentro de um mesmo universo de discurso, sejam entre universos de discurso distintos. Em outras palavras, o fato da oposição engendra a dialética.

(5) A controvérsia termina em um acordo entre as partes. No entanto, isso não significa que o acordo seja uma resolução dialética, embora devesse sê-lo.

(6) Os fatos são elementos não-discursivos e, portanto, não exercem função determinativa em um discurso dialético. No entanto, não somente fatos, mas emoções, desejos, propósitos, circunstâncias econômicas, orientações religiosas, excentricidades pessoais etc. freqüentemente são fatores causais de controvérsias e disputas, quando não determinam as escolhas feitas pelo indivíduo no decurso do desenvolvimento argumentativo. Tais fatores impedem que dois indivíduos operem dentro de um mesmo universo de discurso. Em suma, na dialética, os fatos possuem status causal, mas não possuem status lógico.

(7) No decurso de qualquer desenvolvimento argumentativo, a dialética depara-se com dilemas ou alternativas. Em última instância, tais alternativas são determinadas pelas proposições que estabelecem a contradição original. A escolha de uma das alternativas implica necessariamente na determinação das escolhas subseqüentes. Por isso, a dialética também pode ser descrita como o processo que lida com dilemas ou alternativas co-implicadas.

A dialética na prática

Neste ponto, talvez seja interessante fazermos algumas digressões empíricas acerca da dialética.

Comecemos pela linguagem. A linguagem é o meio através do qual os homens discursam e, ao mesmo tempo, é o meio que limita o discurso dos homens. Isso significa que a linguagem apresenta condições limitantes para a realização dos valores lógicos do discurso.

O primeiro fator lingüístico que manifesta tal limitação encontra-se na diferença entre os significados denotativo e conotativo das palavras. O significado denotativo refere-se aos objetos, enquanto o significado conotativo é determinado pela relação com as outras entidades de mesmo tipo. As propriedades conotativas são as responsáveis pelas inúmeras e elaboradas ramificações das definições e distinções da linguagem. Se essa riqueza é uma benesse, não deixa de ser também um problema. As dificuldades de definição que surgem dessa riqueza é precisamente o escopo da dialética. As palavras não são como símbolos matemáticos, cujos significados são precisos e padronizados. As palavras do vocabulário discursivo são criaturas orgânicas, cuja longa história de variações semânticas é evidência de sua capacidade para a ambiguidade verbal. O dicionário não é uma sistematização de definições, mas apenas uma coleção de definições; a definição de qualquer termo implica necessariamente em uma regressão infinita para outros termos, o que torna a quantidade de definições virtualmente infinita.

A única maneira de interrompermos essa regressão é por meio de uma denotação, que tem a capacidade de satisfazer o desejo de explicar o significado de um termo. Afinal, os fatos nunca contradizem a si próprios, mas as afirmações acerca deles é que se contradizem. Fatos são criaturas mudas, cujo poder reside em sua posição e movimento. As opiniões também são, a rigor, fatos: elas não se desafiam mutuamente, nem mesmo tornam-se necessariamente significantes. Elas só se contradizem quando perguntamos: "O que significa dizer que...?" Esta é a pergunta-chave da dialética. A competição entre as opiniões é, na verdade, um processo de apropriação: a opinião deixa de ser amorfa para que, motivada pela pergunta, busque apropriar-se de fatos que lhe dêem interpretação. No entanto, quase nunca é possível apontar para um objeto quando somos questionados acerca do significado de alguma palavra ou opinião. Assim, cabe-nos aumentar a força denotativa de uma opinião refinando a conotabilidade dos termos envolvidos. A definição é um processo cumulativo, plástico, que requer movimento dentro do universo de discurso no qual está inserida.

O segundo fator lingüístico é a dupla referência verbal, conotativa e denotativa. Ocorre que essas duas dimensões apresentam um certo grau de independência entre si. Assim, além das usuais contradições conotativas, uma mesma palavra pode adquirir uma conotação em desacordo com a denotação original (por exemplo, quando chamamos o rabo de uma mula de "perna", estamos procedendo exatamente desta forma, pois, a rigor, nada poderia nos impedir de fazer isso). Psicologicamente, isso se explica pela relação entre razão e sentido. O mundo exterior, o qual percebemos por meio dos sentidos, depende do tamanho do vocabulário e do grau de refinamento da linguagem da pessoa; por outro lado, a linguagem cresce na medida em que os objetos são perceptualmente descobertos e suas partes são imaginativamente recombinadas. Ambas as reações -- sensoriais e verbais -- ocorrem simultaneamente e influenciam-se mutuamente.

O terceiro fator lingüístico é a qualidade metafórica. Os poetas dizem que a Lua é a rainha da noite, enquanto os cientistas dizem que ela é o satélite natural da Terra. Aprendemos que os poetas adotam uma linguagem metafórica, enquanto os cientistas adotariam uma linguagem literal. Mas não é bem assim. A linguagem científica é tão metafórica quanto a poética, pois a linguagem é sempre metafórica, a despeito se seus valores imaginativos sejam abstratos ou concretos. "Todas as nossas percepções e pensamentos são símbolos acessórios aos objetos, e jamais cópias daquilo que materialmente existe nas profundezas da natureza", dizia Santayana.  Vaihinger, por sua vez, dizia que Kant não era o maior dos metafísicos, mas o maior dos "metafóricos". Todo pensamento é uma comparação. É por isso que as afirmações, isoladamente, não podem ser julgadas. É necessário dar-lhes contextos que, mesmo sendo eles também metafóricos, auxiliarão no processo de tornar os significados das afirmações mais claros. A impressão de literalidade da ciência advém do grau de precisão e uniformidade de seus termos, do fato de seus termos formarem um sistema metafórico mais bem organizado.

Esta qualidade metafórica confere à linguagem uma conseqüência interessante. A oposição ou conflito entre opiniões só poderá ser inteligível se elas forem definidas de maneira que pertençam ao mesmo modo metafórico, ou seja, às mesmas convenções lingüísticas. [Por exemplo, na Divina Comédia, Dante alerta quanto aos quatro modos metafóricos que podem ser aplicados na leitura: literal, alegórico, moral e anagógico.] É somente desta forma que suas contradições podem ser entendidas e tratadas.

Portanto, esses três fatores lingüísticos explicam as ambiguidades no discurso verbal, e não raro são tais ambiguidades que engendram os conflitos e contradições que a dialética procurará solucionar, seja esclarecendo o uso das palvras, seja resolvendo as dificuldades lógicas do discurso.

Mas a linguagem não é o único aspecto empírico sobre o qual devemos nos debruçar. Há também aspectos psicológicos a serem considerados para o exercício da dialética. Há três aspectos psicológicos:

(a) Ócio. No contexto da dialética, "ócio" não significa exoneração econômica, mas exoneração de toda e qualquer obrigação prática, uma postura deliberada de impraticabilidade. Isso não significa dizer que a atividade intelectual não tenha conseqüências práticas, mas significa que a atividade intelectual deve ser exercida independentemente de quaisquer questões práticas que porventura possam existir. Lembre-se de que a conversação, para ser dialética, deve referir-se ao universo de discurso e, portanto, deve ser totalmente teórica. Em outras palavras, a dialética situa-se fora do âmbito dos fatos e expressa-se existencialmente no nível conotativo da linguagem. É verdade que uma discussão pode ser encerrada mediante a alusão a fatos, mas isso, dialeticamente falando, não tem a menor importância. O pensamento dialético é inconcluso, exigindo uma postura totalmente teórica, ou seja, o dialético deve estar imbuído do espírito do ócio o mais que possível. A dialética não possui um objetivo intelectual, no sentido de que deva resolver um problema ou completar um sistema; aliás, poderíamos mesmo dizer que a dialética ocupa-se precisamente em demonstrar e entender que os problemas não podem ser resolvidos e nenhum sistema pode ser absolutamente completado, em termos puramente intelectuais. As pessoas comuns precipitam-se em uma miríade de fatos e argumentos enquanto conversam, às vezes até mesmo discutindo fatos ou defendendo determinadas conclusões como sendo absolutamente verdadeiras. Tratam-se de grande erros de conversação.

(b) Inteligência. Pensar é uma habilidade que varia de pessoa para pessoa. No entanto, não se trata apenas de diferenças de hábito, mas de dom natural e de circunstâncias vigentes. Não há dúvida de que é necessário um mínimo de capacidade intelectual para levar a cabo uma atividade como a dialética. A arte da conversação filosófica não é para qualquer um. Porém, mesmo entre as pessoas intelctualmente dotadas, os obstáculos conversacionais podem ser explicados pela discrepâncias entre as inteligências envolvidas. William James ensinava que "antes de mais nada, é imprescindível que o crítico apreenda imaginativamente o centro de visão do autor a ser criticado". A incapacidade para empreender tais insights é uma das principais causas das confusões e conflitos entre as pessoas. A imaginação intelectual é o elemento que torna possível a tradução entre os universos de discurso. Dialética é encontrar o universo de discurso comum a ambos os lados; o acordo entre as partes reside nisso, e não em uma mera concórdia mútua que encerre a discussão.

(c) Temperamento. As fraquezas emocionais também explicam as aberrações de entendimento que as pessoas freqüentemente apresentam. O problema com o louco que pensa ser Napoleão não está no personagem emulado, que em geral apresenta traços incrivelmente bem sistematizados e organizados, mas nos limites impostos por duas ou três suposições básicas, de natureza emocional. É partir delas que o sujeito desencadeia sua ilusão. Embora o exemplo possa ser exagerado, o fato é que uma grande quantidade de argumentos são defendidos pelas pessoas comuns exatamente desta forma. A diferença entre o pseudo-Napoleão e as pessoas comuns é de grau, e não de tipo. Ambos são iludidos, dialeticamente e pragmaticamente falando. A falta de insight, ou seja, a incapacidade para a autocrítica, é um fenômeno comum dentro e fora dos hospícios. Ambos são incapazes de contemplar as suposições e premissas que compõem seu dogmatismo. O objetivo da dialética é disciplinar essa inclinação natural para o dogmatismo. A discussão, a disputa consersacional, assemelha-se muito mais à situação de conflito entre dois neuróticos do que a oposição entre sistemas geométricos distintos. A dialética é um tipo de psicanálise, pois procura substituir os fatores que engendram o dogmatismo por posturas dialéticas. No que tange seu exercício, eis algumas regras fundamentais de "etiqueta dialética":

    (i) Exibir a emoção. É humanamente impossível discutir e, ao mesmo tempo, manter-se neutro. Se o amor é um componente inseparável da lógica, é muito melhor confessá-lo do que ocultá-lo. A idéia é que os argumentadores exponham qualquer suspeita de motivação emocional e viés temperamental quando entrarem em discussão. O resultado é que o argumento será purificado desse tipo de confusão. Lembre-se: os fatores emocionais não são razões e, portanto, não devem ser tratados como tal.

    (ii) Postulação explícita. O argumento não deve ser crítico somente em suas influências emocionais, mas também o deve ser em nível intelectual. Isso significa que as premissas, conforme ensinava Platão, são hipóteses, e o valor da conclusão consiste justamente na explicação adequada do significado das premissas. O indivíduo deve se esforçar para tornar explícitas as proposições intuitivas que compõem seu insight, pois, do contrário, será incapaz de reconhecer os fundamentos de seu próprio pensamento e de perceber as fontes das afirmações do oponente. Muitas vezes, a crítica intelectual não é feita por motivos emocionais; por isso, esta regra e a anterior são, na verdade, a mesma.

    (iii) Imparcialidade. A imparcialidade é resultado de um certo "partidarismo esclarecido". Em outras palavras, caso uma contenda tenha sido encerrada em um acordo, os dois lados devem encarar este acordo como algo totalmente relativo ao universo de discurso dentro do qual se deu a contenda. Muitas pessoas não entendem como é possível ser imparcial e, ao mesmo tempo, partidário. Esse paradoxo psicológico se explica quando entendemos que a disputa é dividida em dois estágios: enquanto a participação ativa na argumentação é algo necessariamente partidário, é necessária também a adoção de uma postura imparcial no que tange as oposições e contradições intelectuais. O indivíduo imbuído de um espírito verdadeiramente dialético conseguirá emular os dois estágios alternadamente, ao longo da própria contenda.

    (iv) Impraticalidade. Freqüentemente, as barreiras emocionais, a ocultação de postulados e a parcialidade intelectual ocorrem porque as pessoas levam as contendas a sério demais. Por "demais", quero dizer que as pessoas se apegam demais às questões práticas e circunstanciais do mundo da ação humana. As questões práticas, que obviamente são importantes, têm o revés de obstaculizar a imaginação intelectual necessária para o exercício da dialética, escravizando inconscientemente os participantes aos ditames das circustâncias vigentes.

A estrutura lógica da dialética

Um dos aspectos mais importantes da dialética, para além dos aspectos empíricos, é sua estruturação lógica fundamental.

A dialética é um conjunto de actos lógicos. Acto lógico é a actualização de uma relação potencial que existe entre as entidades de um universo de discurso. As relações potenciais e seus respectivos actos lógicos são as seguintes:

Relação potencial     |   Acto lógico
-----------------------------------------
oposição                   |  definição
implicação                |  análise
ordem sistemática    |  análise e síntese (sistematização)
ordem hierárquica     |  análise e síntese (hierarquização)

O acto lógico, por sua vez, é algo explicitamente afirmado em uma proposição. As proposições podem assumir as seguintes formas: definição, postulado e teorema. A diferença entre elas está em suas funções sistemáticas. Sistema é um conjunto de proposições relacionadas entre si por implicação. As implicações são engendradas pelo conjunto de postulados, os quais formam o que chamamos de doutrina do sistema, ou seja, as definições e suposições; os teoremas, por sua vez, explicitam essas implicações. A doutrina, isto é, as definições e postulados, constitui o que poderíamos chamar de proposições intuídas ou aceitas, enquanto os teoremas constituem as proposições demonstradas. A dialética não se interessa pelos sistemas em si, como seria o caso da lógico matemática, mas pelas relações entre os sistemas em conflito; a oposição é, portanto, o tema fundamental da lógica da dialética. Ademais, a dialética interessa-se pela coordenação da fase descritiva da doutrina abstrata dentro de uma estrutura lógica; assim sendo, a dialética também difere da simples lógica de inferência dedutiva-indutiva.

As implicações não apenas organizam as proposições de maneira sistemática, mas lhes conferem ordem hierárquica. A hierarquia organiza as entidades de acordo com os níveis determiandos pela análise de suas relações todo-parte.

(i)

O discurso possui dois tipos de componentes: os termos e as proposições. Proposição é uma relação entre termos. Os termos, por sua vez, são classes. ou seja, são um conjunto de condições de identidade que determinam a correlação dos itens do discurso. Os itens que porventura satisfaçam esse conjunto de condições farão parte da classe; os itens que não satisfizerem tais condições estarão fora da classe.

As classes relacionam-se por relações de parte-parte, todo-parte e parte-todo. Essas relações são chamadas de implicações. A parte é uma classe que necessariamente implica a existência de outras partes, que as exclui e é por elas excluída. A parte está incluída no todo, mas não implica este todo; em vez disso, a parte pressupõe o todo, o que equivale a dizer que o todo, ao qual a parte pertence, implica a parte. O todo é uma classe que inclui todas as partes. Ademais, no momento que é definido, o todo implica a existência de outras classes distintas de si próprio, pelas quais é excluído. Portanto, verificamos que o todo também é parte, tanto em relação a outras partes quanto em relação aos todos que incluem essas partes, as quais são implicadas por eles. Toda classe é um todo quando implica partes, e toda classe é uma parte quando é implicada por um todo. Há uma relação de reciprocidade simétrica, de relação filial e parternal. Verifica-se, portanto, que há uma relação hierárquica regulada pelas relações todo-parte, a qual independe da natureza material ou abstrata dos itens ordenados.

Termos, proposições e sistemas são níveis distintos na ordem hierárquica das relações entre todos e partes. Um termo é parte de uma proposição; uma proposição é parte de um sistema. Essas relações existem no discurso em potência. São necessários actos lógicos para torná-las explícitas, e são precisamente esses actos lógicos que constituem a dialética, ou seja, a dialética pretende exibir as relações hierárquicas parte-todo que existem em um discurso.

Conforme dissemos acima, as proposições, sistematicamente falando, são classificadas em definições, postulados e teoremas. As definições possuem três propriedades: (a) a definição indica a natureza intensiva de um todo e o conjunto de condições que limitam a membrazia de classes subordinadas e esse todo; tais classes subordinadas são as partes desse todo; (b) já que a definição determina uma classe como sendo um todo, ela também determina outras classes exatamente pela exclusão de suas propriedades; (c) as classes determinadas e excluídas pelas definições são coordenadas, ou seja, elas se implicam mutuamente e se excluam mutuamente; em outras palavras, por serem classes coordenadas, elas necessariamente relacionam-se enquanto partes de um todo de ordem superior, ou seja, elas pressupõem tal classe superior, a qual, por sua vez, as implicará quando for definida, e assim por diante, indefinidamente.

Os postulados e teoremas são proposições analíticas, ou seja, não determinam as condições de identidade de uma classe como um todo, ou seja, elas não definem. Elas expressam a relação de um todo com suas partes ou a relação das partes coordenadas entre si. Em suma, os postulados e teoremas servem para analisar a natureza de um todo e determinar a ordem das partes nesse todo, isto é, seus níveis hierárquicos. Os postulados são de ordem superior, pois os teoremas analisam as implicações subordinadas dos postulados. Em outras palavras, os postulados implicam os teoremas, enquanto os teoremas pressupõem os postulados. Assim, primeiramente temos as definições, depois os postulados, cuja função é exibir as implicações subordinadas das definições, e depois os teoremas, cuja função é exibir as implicações dos postulados. Os teoremas completam a explicação analítica da ordem sistemática implicada pelas definições e postulados.

As definições e os postulados formam a doutrina do sistema e devem ser independentes entre si, ou seja, não devem se implicar mutuamente. Por exemplo, um postulado que é implicado por outro postulado é, portanto, demonstrável, o que faz dele, na verdade, um teorema, e não um postulado. Em suma, a doutrina do sistema é declarada como verdadeira por suposição, sendo que o status das proposições é de caráter intuitivo -- são proposições intuídas; os teoremas do sistema são declarados como verdadeiros por implicação, sendo que o status desses teoremas é de proposições demonstradas.

Há duas fases em qualquer procedimento dialético: (a) a origem e elaboração de conflitos; (b) a resolução dos conflitos e a tradução dos universos parciais de discurso. Os conflitos surgem por causa de oposições entre sistemas, mas nunca por causa de oposições entre proposições isoladas ou sistemas isolados.

(ii)

Oposição não é contradição. Oposição é uma declaração de alteridade, enquanto contradição é uma declaração de rejeição. A oposição surge porque há, em qualquer definição, uma força ou inclinação que necessariamente diferencia as classes; ora, definir uma classe -- declará-la um todo -- não contradiz todas as demais classes que não foram assim definidas, mas apenas as nega no sentido de que as declara como outras classes, daí portar o sentido de alteridade.

O primeiro estágio da dialética é precisamente a definição, melhor dizendo, a oposição entre definições. Esta oposição é declarada mediante a afirmação das duas proposições opostas. Lembre-se de que a mera afirmação de oposição não implica em rejeição.

O segundo estágio da dialética é a análise. Os todos estabelecidos pelas definições são passíveis de análise, pois há, dentro de cada definição, uma ordem hierárquica de relações parte-todo; a esta ordem hierárquica chamamos de "sistema dedutivo", ou seja, é um sistema de proposições que formam a doutrina do sistema (definição + postulados), bem como seus teoremas. As definições e postulados são um conjunto de proposições sistemáticas, pois só são compreendidas por suas implicações mútuas; os teoremas, por sua vez, explicam essas proposições e só podem ser entendidos pelos termos da doutrina. Portanto, toda proposição é compreendida ou no âmbito de uma fonte doutrinal de um sistema de proposições ou no âmbito de uma proposição implicada por um sistemas de proposições.

O terceiro estágio da dialética é a síntese. Ao contrária da análise, que é composta por actos lógicos, a síntese exige imaginação intelectual, isto é, insight, intuição, inferência. Neste estágio, procuramos resolver o problema dialético mediante a detecção dos postulados de um sistema, mas não mediante a dedução dos teoremas de um sistema a partir dos postulados. As regras da análise são a implicação e a dedução; no entanto, não há regras para a síntese. A idéia, na síntese, é encontrar a classe supra-ordinada que seja pressuposta pelos sistemas coordenados, isto é, em oposição. Uma vez encontrada, nova análise deverá ser empreendida para estabelecer, com mais critério e cuidado, o sistema que abarca ambos sistemas coordenados.

Este processo dialético deixa claro um aspecto importante: não há oposição absoluta entre sistemas, mas apenas oposição parcial. A oposição contém, em si mesma, a fonte de sua própria resolução. Os sistemas opostos serão sempre partes de um sistema supra-ordinado, e assim por diante, indefinidamente. Além disso, o novo sistema jamais representará uma resolução absoluta, pois algumas proposições necessariamente terão de ser excluídas dele para que abarque os sistemas anteriormente em oposição. Novamente, há um processo a-lógico de escolha entre dilemas, ou seja, entre dois ou mais sistemas supra-ordinados que satisfazem as condições de resolução da oposição mas, cada um a seu jeito, inclui e exclui proposições dos sistemas originais.

Fica claro, portanto, que há uma inevitável frustração inerente ao processo dialético, e que essa frustração é fruto da estrutura hierárquica infinita do universo de discurso. Ademais, o fim da dialética, conforme mencionamos anteriormente, não pode ser a verdade, já que há somente três tipos de verdades, proposicionalmente falando: (a) as verdades factuais, que naturalmente não são dialéticas; (b) as verdades intuitivas, as quais apenas presume-se que sejam verdadeiras; (c) as verdades demonstradas, cuja veracidade depende de outras proposições. Vê-se, portanto, que as proposições podem estar em contradição uma com a outra, mas apenas factualmente falando, ou nos casos em que tais proposições estejam descoladas de seus respectivos sistemas/universos de discurso/modos metafóricos. Caso contrário, o que o dialético deve fazer é introduzir a proposição dentro de seu sistema, e o resultado será necessariamente uma oposição entre os sistemas, mas não uma contradição. Não existe contradições, em termos dialéticos, porque, se existissem, poderíamos identificá-las como estando dentro de um mesmo sistema, o que, por si só, imediatamente as descaracterizariam enquanto contradições. Isso equivale a dizer que as definições são incapazes de proceder a uma exclusão total e absoluta. Em suma, contradições só existem em proposições isoladas, mas proposições isoladas não são de interesse da dialética. Se duas proposições encontram-se em "contradição", isoladamente falando, seus termos têm apenas identidade verbal, mas não têm identidade definitória.

A metafísica da dialética

E eis que chegamos a uma conclusão metafísica quanto à dialética. Se o universo de discurso não contém, de maneira alguma, contradições; se as entidades discursivas podem ou não ser verdadeiras; se o universo de discurso é um ordem hierárquica infinita, cujos elementos encontram-se em infinita oposição, e cada oposição pode ser apenas parcial e inconclusivamente resolvida, então o universo de disurso é algo que se encontra dentro do campo da possibilidade. A possibilidade constitui, portanto, a própria descrição metafísica da dialética.

Uma doutrina metafísica pretende definir e descrever um todo-último (ultimate whole). O todo-último transcenderia toda e qualquer oposição, atingindo, portanto, o status de finalidade.

O todo-último é infinito, pois possui uma relação infinita de hierarquias, e determinado, pois é um todo. Assim, a característica determinadora insere o todo-último no campo da possibilidade. Por outro lado, a actualidade (o campo dos fatos) necessariamente impossibilita que todas as possibilidades se manifestem, já que isso necessariamente implicaria em contradições. As contradições se manifestam em declarações factuais, mas quanto a isso a dialética nada tem a dizer, permanecendo necessariamente em silêncio.

Assim, podemos resumir a metafísica da dialética nos seguintes postulados:

I. O universo de discurso é um todo-último (ultimate whole), infinito, mas determinado.

II. A determinação do universo de discurso é a relação parte-todo de suas entidades em uma ordem hierárquica de implicação.

III. Toda entidade do discurso está internamente relacionada a todas as outras entidades, mas em variados graus de proximidade.

IV. A dialética define-se, potencialmente falando, como sendo a estrutura formal do universo de discurso, e, actualmente falando, como sendo a atividade que exibe essa estrutura com certo grau de limitação, ou seja, o lado empírico da dialética (linguagem) limita o aspecto lógico dela.

Podemos extrair alguns teoremas importantes da descrição acima:

1. Não há relação de contradição no universo de discurso.

2. O universo de discurso está, portanto, ontologicamente inserido no campo da possibilidade.

3. A dialética está, portanto, inteiramente restrita ao universo de discurso.

4. A dialética, portanto, é incapaz de lidar com a relação entre os campos ontológicos do discurso e da existência.

5. Todas as oposições no discurso podem ser resolvidas.

6. Todas as resoluções dialéticas são parciais e inconclusivas.

7. Potencialmente falando, a dialética é absolutamente inconclusiva.

8. Actualmente falando, a dialética é relativamente inconclusiva.

9. A dialética é capaz de manifestar apenas verdades intrínsecas, sendo que tais verdades jamais podem ser finais.

10. Nenhuma proposição isolada é verdadeira ou falsa; em algum sistema, todas as proposições poderão ser verdadeiras.

Adler conclui que filosofia e dialética são a mesma coisa. Para ele, a filosofia é a atividade da controvérsia intelectual, ou seja, da oposição de opiniões e teorias. A filosofia, pela própria natureza da dialética, ocupa-se exclusivamente com sistemas de possibilidades. A ciência, por outro lado, ocupa-se de actualidades, de fatos brutos; os problemas científicos são resolvidos pelo método da investigação e da experimentação. Assim sendo, podemos dizer que os fatos possuem três ordens: (1) a primeira ordem dos fatos brutos; (2) a segunda ordem dos fatos, que são as afirmações acerca da primeira ordem (ciência); (3) a terceira ordem dos fatos, que são as proposições e opiniões acerca da segunda ordem (filosofia). Os objetos dos universos parciais de discurso da ciência são actualidades, enquanto os objetos dos universos parciais de discurso da filosofia são outros universos parciais de discurso.

As verdades filosóficas, portanto, só podem existir entre as entidades do discurso, seja por implicação ou pressuposição. Assim, não existem verdades factuais, filosoficamente falando, pois essas pertencem ao âmbito da ciência. A filosofia não é como a teologia, que elege um universo parcial de discurso como sendo dogmaticamente verdadeiro. A filosofia é incompatível com a parcialidaade da teologia. Neste sentido, teologia e ciência são profundamente semelhantes, não por causa de seus objetos, mas porque elegem universos de discurso como verdadeiros: a ciência o faz mediante as actualidades, enquanto a teologia o faz mediante os dogmas e "artigos de fé". É por isso que a história da filosofia nada mais é do que tentativas de transformá-la em uma religião: ora os filósofos não foram verdadeiramente dialéticos, ora eles confundiram a filosofia com ciência ou teologia.

A filosofia deve permancer livre de dogmatismos, e pouquíssimos filósofos seguiram esta regra à risca. Adler acredita que Platão talvez seja o único autêntico filósofo que já existiu. A filosofia parece que progride hoje em dia porque há uma tradição européia de pensamento e um vocabulário relativamente bem estabelecido, mas isso é pura ilusão. A filosofia é fútil e frustrante, pois jamais chegará a nenhuma conclusão intelectual, a nenhum sistema teórico final. A postura científica é dogmática e pragmática, enquanto a postura filosófico-dialética é imparcial e imprática. O único aspecto "prático" da dialética é impor ao pensamento sua própria irrelevância no que tange as questões práticas.

Portanto, a filosofia é a atividade típica das pessoas que, além de desfrutarem de liberdade intelectual, o fazem não sem certo espírito cômico. Se a condição de infinita possibilidade confere um caráter trágico ao intelecto humano, as limitações que a actualidade impõe ao pensamento também são trágicas. A filosofia é a emancipação do intelecto e o cultivo desse espírito cômico. A filosofia é apenas uma atividade para que o praticante se torne sensível à vida e às diferenças e oposições que pervadem o mundo dos homens.

Adler vs. Adler

Como dissemos no início do artigo, Adler discordou das conclusões a que chegou na medida em que amadurecia os estudos que empreendia, e mesmo durante as discussões que mantinha em suas aulas sobre os Great Books. Adler percebeu que a filosofia é capaz, sim, de alcançar a verdade. Mas qual o erro fundamental que cometeu?

Em Dialectic, Adler situa a filosofia entre a ciência e a teologia. A ciência, ocupando-se dos fatos brutos, que são elementos extrínsecos, lida com aspectos denotativos. A teologia, procedendo de forma intuitiva ou mediante insights, também alega portar certeza extrínseca. E a filosofia? Será que ela é apenas uma atividade para tagarelas pretensiosos? Um passatempo de crianças crescidas?

Adler percebeu que a filosofia também possui seu aspecto extrínseco, o que faz dela um tipo de ciência. Ocorre que o objeto da filosofia não é como o objeto das ciências. As ciências recortam um campo particular da realidade e o estudam com um método adequado a aquele campo. É o caso da biologia, da física, da química, da astronomia. Mas o campo particular da realidade que é objeto da filosofia é a realidade considerada em seu aspecto geral, ou seja, é um campo ao qual todo ser humano está imerso e nele vive e convive. Há certas experiências que não são exclusivas de determinados cientistas, mas que são comuns a todos. Em suma, na filosofia, todos os homens são "cientistas".

Este é o erro fundamental de Dialectic. Embora a descrição empírica, lógica e metafísica da dialética estejam corretas, o erro está em identificá-la com a filosofia, ou seja, em reduzir a filosofia à dialética. A dialética é um instrumento da filosofia, mas a filosofia é mais do que dialética: ela freqüentemente apela aos fatos, interrompendo o processo dialético e invocando a imaginação intelectual para além do jogo de definições, postulados e teoremas.

Exemplos de ciência filosófica são a ética, a estética, a política, a epistemologia. São aspectos da realidade acessíveis a todos, são fatos aos quais todos têm acesso, mas sobre os quais nem cientistas nem teólogos se debruçam detidamente. Este é o habitat dos filósofos. Isso não quer dizer que teólogos não tenham nada a dizer sobre ética, estética, política etc. Adler ensina que os três elementos da alta cultura se distribuem de maneira hierárquica. A teologia vem primeiro, pois trata de questões últimas, superiores, máximas, para além do mundo natural. A filosofia vem em seguida, imitando de certa forma a teologia, mas apegando-se a questões últimas mas naturais. E, por fim, a ciência, que reduz-se aqui e ali a aspectos empíricos e mais limitados. Assim, é evidente que a teologia deve "informar" a filosofia, como se aquela fosse um universo de discurso mais amplo, dentro do qual universos filosóficos parciais devem se inserir e do qual devem partir. Similarmente, a teologia e a filosofia devem "informar" as ciências naquilo que lhes cabem cada universo de discurso parcial. É como se os teoremas teológicos formassem a doutrina filosófica, e os postulados filosóficos formassem a doutrina científica. Contrariamente, por inferência (ou "pressuposição", no linguajar adleriano), é como se descobríssemos os postulados filosóficos mediante a doutrina científica, ou os postulados teológicos mediante a doutrina filosófica.

Resta saber se a metafísica é um dos objetos da filosofia. Este é um assunto importantíssimo, sobre o qual pretendo versar em breve.

1 de outubro de 2010

Educação secular


Os homens de bom-senso admitem que a maior de nossas vantagens é a educação; não somente esta nossa forma mais nobre de educação, que despreza a glória e os ornamentos retóricos e apega-se à salvação e à beleza dos objetos que são alvo de nossa contemplação, mas também a cultura exterior, a qual muitos cristãos consideram abominável, maliciosa e perigosa e que, segundo eles, nos afasta de Deus. Pois não devemos rejeitar os céus, a terra, o ar e todas essas coisas só porque algumas pessoas se apoderaram impropriamente delas e honram as obras de Deus ao invés de honrar o próprio Deus; mas devemos colher delas as vantagens que estiverem ao nosso alcance para benefício de nossas vidas e para nossa fruição, ao mesmo tempo que devemos evitar seus perigos; não devemos usar a criação, como os tolos o fazem, em levantes contra o Criador, mas, a partir das obras da natureza, devemos apreender o Criador, e, como ensina o santo Apóstolo, levando cativo todo o entendimento à obediência de Cristo. Repito que, assim como nem fogo, nem alimento, nem ferro, nem quaisquer elementos sejam proveitosos ou danosos exceto pela vontade de quem os faz uso, assim como formulamos remédios úteis a partir de elementos que se encontram até mesmo em répteis, assim também a literatura secular fornece-nos princípios para a investigação e a especulação, ao mesmo tempo em que rejeitamos sua idolatria, terror e destruição. Ora, até mesmo essas coisas auxiliam em nossa religião, pois percebemos o contraste entre o pior e o melhor e reforçamos nossa doutrina a partir da fraqueza da doutrina deles. Assim sendo, não devemos desacreditar a educação só porque algumas pessoas gostam de fazer isso, mas devemos, isso sim, considerar estas pessoas como sendo rudes, grosseiras e incultas, pois desejam que todos os homens sejam como elas, para que então possam se diluir em meio ao público e sua falta de cultura não seja detectada. Mas vinde agora, e após este breve esboço de nosso assunto e estas considerações, contemplemos a vida de Basílio.

Fonte: São Gregório, o Teólogo (+391), Discurso XLIII sobre a vida de São Basílio, o Grande, §11