18 de maio de 2022

A mente religiosa segundo Krishnamurti


O objetivo de Krishnamurti é ajudar o leitor a despertar em si uma mente plenamente consciente.

O homem que busca é imaturo porque o que quer na verdade é uma autoridade que lhe apresente a verdade. Isso é necessariamente falso porque a verdade é viva, dinâmica, não algo estático. Portanto, livrar-se de autoridades é fundamental.

O conhecimento não liberta, mas, ao contrário, aprisiona a mente em memórias acumuladas. Isso significa, na prática, que somos pessoas condicionadas pelo conhecimento, por opiniões, ou, em outras palavras, pelo passado. Entenda que não somos capazes de ver algo como realmente é, sem a intermediação de análises intelectuais, o que é fundamental.

Esse conhecimento reduz a consciência a uma pequena porção. Para ampliá-la é necessário empregar a atenção total, que é diferente de concentração. É como estar em um quarto fechado com uma cobra dentro. Você estará totalmente atento a ela, totalmente focado. Não é um processo intelectual.

A alegria que sentimos em determinada situação é desmanchada pela mente, que procura repetir a alegria e, assim, a transformar em um prazer. O medo de perder o prazer é fonte de dor. Por isso é necessário aprender a se livrar do prazer e, portanto, da dor. Somente a total atenção é capaz de desfrutar de alegria.

O medo nada mais é do que a transição, o movimento, da certeza para a incerteza. Medo do desemprego, da traição, da doença, dos perigos, da passagem, enfim, para a incerteza: medo de que o passado volte, medo do que virá no futuro. O medo é essa projeção do pensamento em passado e futuro. Nós não apenas "temos" medo: nós "somos" medo.

Não é difícil ver que o medo gera violência. A agressão enquanto desejo de dominar o próximo é fruto da perseguição do prazer e da fuga da dor. As divisões que criamos ("cristão", "europeu") são resultado da agressividade, fruto da separação. Só o homem que vive no momento, no instante, é realmente livre disso.

Portanto a verdadeira ação está na inação, ou seja, no extermínio da comparação, da dualidade, do "precisa", do "deveria". É necessário acabar com ideais, com imagens, com projeções, com símbolos, para assim acabar com os estímulos que, por sua vez, trazem consigo a dependência.

"Você nunca está só porque está cheio de memórias, de condicionamentos, de ruminações do passado; sua mente nunca está limpa do lixo acumulado ao longo do tempo. Estar só é estar morto para o passado. Quando está só, totalmente só, sem pertencer a nenhuma família, a nenhuma nação, a nenhum continente, eis aí quando você será um pária. O homem que está completamente só é inocente, e é esta inocência que liberta a mente do sofrimento".

Assim que é urgente entender que a morte é a porta de entrada da vida. Não, não se trata de uma piada. Morrer para o tempo, morrer para o intervalo entre a ideia e a ação, ou seja, morrer para o pensamento, eis o caminho para a ação. Nós inventamos o tempo, o futuro, nós mergulhamos na agonia do passado. Esse jogo estúpido do tempo, eis o que bloqueia o caminho da vida, que é, obviamente, a morte.

Este é o caminho do amor. Não, amor não é o que você chama de amor. Isso que você chama de amor é apenas uma projeção da sua imaginação devidamente envernizada de respeito e consideração por algo ou alguém. Amar é estar morto para a responsabilidade e para o dever. O amor só existe na liberdade, na ausência do pensamento, na ausência da preocupação.

Por isso o amor, assim como a contemplação do belo, exige uma postura austera, isto é, de independência, desprendimento, desinteresse, de total e completa simplicidade, de humildade. O amor, a beleza, a verdade, nada disso se cultiva, mas o que, sim, é possível, é ganhar consciência e, a partir daí, observar o prazer, a dor e a tristeza em ação e, assim, observar o espaço-tempo, a imagem, que separa você do mundo.

Não tardará e você notará que você, o observador, é na verdade mais um elemento do observado. E mais: todo o observado é, em realidade, você. Aqui termina o conflito entre você e a imagem. Aqui começa a inteligência propriamente dita. Ora, a inteligência começa, portanto, quando termina o pensamento.

Mas livrar-se das imagens, do pensamento, é apenas o começo do tão desejado silêncio, da solidão, da paz.

A meditação em si não é, portanto, livrar-se do pensamento, mas observar o pensamento, seus movimentos, seu desenvolvimento, sem controlá-lo. O meditador, ele mesmo, está completamente ausente.

É a mente religiosa, a mente que não age por princípio, por valores, por deveres morais dessa ou daquela natureza. É, enfim, a mente que ama sem saber o que é amor.

Fonte: Jiddu Krishnamurti, Freedom from the Known, Random House, Londres, Reino Unido, 2010.