26 de março de 2021

Gestão emocional: a essência da liderança


A sensibilidade racional

Reconhecer suas neuroses é bom; decidir fazer algo para resolvê-las é melhor ainda; mas fazer esse algo, concretamente, é uma coisa totalmente diferente. Cuidado, contudo, para que esses insights não se transformem em pensamentos do tipo: “Eu vejo com clareza que ando me comportando de maneira idiota, portanto sou um idiota!”

A solução? Adquirir sensibilidade racional. Em outras palavras, tornar-se sensibilizado, mas não sensível: em termos mais claros, ensinar-se como ser sensível sem ser vulnerável.

A sensibilidade racional consiste em empregar seus pensamentos e emoções de maneira que você se torne cada vez mais sensível e perceptível aos seus próprios erros e aos erros dos outros. Ao mesmo tempo, consiste em tornar-se infinitamente menos vulnerável, menos condenatório, quando você erra, ou quando os outros erram. É a capacidade de agir de maneira autêntica, e deixar que os outros ajam de maneira autêntica, sem condenar-se a si ou aos outros quando formos tolos, quando cometermos erros ou quando agirmos de maneira autodestrutiva.

Um dos pensamentos mais comuns nessas situações é que devemos ser castigados pelo que fizemos. Castigo, neste sentido, não significa apenas penalização. Se você continuar apresentando um mal desempenho o que poderá acontecer é que será penalizado: ou seja, você não será recompensado por ter sido bem sucedido, será criticado por cometer algum erro, não poderá continuar no projeto etc. Mas castigo significa penalização mais condenação. Significa que só porque cometeu um erro você tem que ser especialmente condenado a sofrer nesta terra, pois você supostamente violou a lei da natureza de que você deve, você tem que, você precisa ser bem-sucedido.

A sensibilidade racional lhe mostrará, de maneira explícita e eficiente, como desinventar os demônios e duendes que você idiotamente inventou e como substituí-los por filosofias de vida racionais: (1) “Não é horrível que meu departamento tenha tido um desempenho tão ruim este ano; é apenas muito inconveniente”; (2) “É claro que eu consigo aguentar esse tipo de fracasso. Nunca irei gostar de fracassar, mas sempre poderei lidar de maneira elegante com isso”; (3) “Não há, nem nunca poderá haver, nenhuma evidência de que eu seja uma pessoa indigna por ter tido um desempenho tão ruim”; (4) “Não importa se eu continuar cometendo erros, eu nunca merecerei ser castigado por meu comportamento ineficaz. Castigo significa condenação; e nem eu nem ninguém seremos condenados mesmo que façamos algo tolo ou irresponsável”.

A essência de praticamente todos os transtornos humanos reside em seu caráter ditatorial, grandiloquente, exigente, típico de criancinhas de dois anos de idade. As pessoas naturalmente, e facilmente, a causa de suas predisposições biológicas e ambiente familiar degradado, creem com devoção e intolerância que elas precisam o que elas querem, que elas precisam ter o que elas preferem, que é um horror se elas forem privadas.

A sensibilidade racional sensibiliza o individuo a suas próprias exigências pueris, bem como as dos demais. Ela lhe mostra como é completamente louco lamuriar-se, reclamar, choramingar e insistir que o universo foi feito especialmente para ele. O indivíduo que pratica a sensibilidade racional, por outro lado, não tem certeza de nada; ele aceita de bom grado o acaso e a probabilidade; ele percebe que nem ele nem ninguém é uma pessoa indigna.

 A sensibilidade racional e o executivo

De certa forma o executivo é um revolucionário nato. Ele naturalmente se conforma em grande medida às regras organizacionais vigentes: pois ele sabe perfeitamente bem que se não as seguir não conseguirá nem mesmo aproximar-se da direção da empresa a qual pertence.

Porém, o líder organizacional realmente dedicado às suas atividades está sempre, de maneira automática, procurando ineficiências por eliminar e eficiências por construir. Raramente fica satisfeito em seguir indefinidamente as mais “bem-sucedidas” e consolidadas políticas da empresa; de outra forma, seu trabalho se tornaria rotineiro e tedioso. Dado que “mudanças radicais” é outro nome para “revolução”, o executivo é sob vários aspectos (e não somente teoricamente) uma das criaturas mais revolucionárias da terra.

O executivo, ademais, é um ser essencialmente lógico e racional. Ou, pelo menos, deveria ser! Pois embora seja emotivo, líder e orientado por comportamentos, ele é forte em pensar, imaginar, planejar, estruturar e teorizar. Ele não apenas age; ele usa a cabeça. Talvez seu ponto mais forte esteja precisamente nisso: enquanto alguns são exímios pensadores, outros extremamente emotivos e alguns extraordinariamente impetuosos, o executivo tende a empenhar-se nessas três formas de comportamento.

Mas como? Bem, tente por um momento observar o homem, não apenas sua obra. Por que o executivo tem poder para executar? Em última instância, porque ele realmente quer. Ele quer, prefere, gosta imensamente de liderar os outros e dirigir empresas. Ele deseja intensamente a eficiência e o sucesso. Ele anseia apaixonadamente atingir os objetivos da empresa. Ele cobiça ativamente vários tipos de poder. Ele normalmente detesta, despreza e odeia a ineficiência, a fraqueza, a desordem e o desperdício. Ele sabe muito bem onde ele quer chegar na vida e está absolutamente determinado a chegar lá.

Mas será que seus desejos, gostos, vontades, ânsias, cobiças, ódios e determinações realmente representam a epítome do desinteresse, da pura objetividade e da frieza? Não tenha dúvida! Muitos de seus métodos podem ser incrivelmente frios e calculados. Ora, mas e as chamas da motivação, aquela motivação que ventila e promove esses métodos? Será que elas também são frias e calculadas?

O verdadeiro executivo é, portanto, naturalmente racional, mas é também naturalmente, no melhor sentido do termo, sensível. Ele não apenas sabe o que é, mas também o que deveria ser.

A sensibilidade racional é sensatamente dualista. Ela reconhece a existência das inclinações totalmente centradas no prazer, as tendências incrivelmente egoístas e maravilhosamente individualistas do cidadão saudável. Mas não se esqueça: as pessoas, em especial os executivos, trabalham com outras pessoas.

A sensibilidade racional o ajudará a que se sensibilize com você mesmo; com as pessoas mais próximas a você (esposa, filhos); a seus colegas de trabalho, a seus superiores e subordinados. Ela oferece a você uma chave para a humanidade: entender os comportamentos incrivelmente repetitivos das pessoas ao seu redor.

 Determinação

Antes de mais nada, o executivo competente é uma pessoa determinada, que decide. Ele pensa por meio de planos e cronogramas. Então é quando ele decide implementá-los com determinação.

Adiar deliberadamente uma decisão é sinal de uma necessidade terrível de aprovação.

Em primeiro lugar, desafie-se: as decisões são parte do processo gerencial; enquanto você for gerente, é você quem decidirá se deve ou não manter uma determinada pessoa na equipe. Quem disse que todos devem tratar você com isenção total? Sim, é triste mandar alguém embora; sim, haverá consequências à esposa e aos filhos do funcionário, que certamente sofrerão; mas não é você que está encorajando a miséria dele, mas ele mesmo.

Mas e o excesso de determinação, ou seja, a ânsia de decidir rapidamente? Não seria isso um problema também? Sim, pode ser. Se sua raiva, sua autodepreciação, sua baixa tolerância à frustração, se tudo isso foi a verdadeira causa de sua decisão impulsiva, açodada, e impetuosa de demitir o funcionário, então, sim, você maculou sua capacidade executiva, sua posição.

Quanto mais reativo você for em relação ao comportamento inadequado de um de seus subordinados, tanto mais será alvo de seu ressentimento e de seu enfrentamento. Dado que esta é a maneira que muitas (mas não todas) pessoas são, por que não aceitar tranquilamente esse fato e até mesmo usá-lo a seu favor?

Pois se você realmente for capaz de resolver o problema fundamental do “ego” e da “autovalorização”, você não apenas estará à frente no jogo da eficiência executiva, mas se tornará invulnerável à maioria dos golpes e “insultos” que certamente receberá ao longo de sua trajetória em outras importantes áreas da vida.

 Concentração

O elemento mais importante para a competência executiva é provavelmente a capacidade de concentração continuada.

Eis algumas regras gerais: Tente concentrar-se nas coisas mais importantes a serem feitas, por você e por outros, para cumprir os objetivos da empresa. Observe sua vida social – e a dos outros – no ambiente de trabalho.

O que está bloqueando a sua concentração eficiente? Ora, você. A principal cagada é provavelmente sua baixa tolerância à frustração, ou, em outras palavras, seu hedonismo de curto prazo. Sim, você sabe que não deve perder tempo com trivialidades, com socializar excessivamente com seu chefe, seus pares, seus subordinados, que você deve concentrar-se no que é realmente importante etc. Mas conhecimento não é ação.

Que tipo de merda está fazendo com você mesmo? Este deveria ser o principal aspecto sobre você: adiar o prazer presente em prol de um ganho no futuro.

 A relação com os outros

Um dos aspectos mais importantes a que o executivo deve prestar atenção é sua relação com os outros. É necessário manter uma relação amigável, embora não necessariamente intima, com eles.

Você sabe perfeitamente bem que há tarefas que deve executar, por mais chatas e inoportunas que sejam; que há pessoas com quem deve relacionar-se, por mais estúpidas e desprezíveis que sejam; que há prazos e processos a cumprir, por mais draconianos e arbitrários que sejam. O problema não é a respeito no quê você deve disciplinar-se, mas como. A falta de disciplina normalmente é causada por uma ideia irracional básica na qual literalmente milhões de indivíduos creem. Ela reza que é mais fácil evitar enfrentar as dificuldades e responsabilidades da vida do que assumir formas mais recompensadoras de autodisciplina.

 Autoaceitação

A característica humana mais valiosa talvez seja a autoaceitação plena.

Poucos psicólogos sabem o que é autoaceitação. Frequentemente confundem autoaceitação com “autoconfiança”, “autoestima”, “autoaprovação”, “amor próprio” e coisas do tipo, que em muitos aspectos não só são diferentes mais contrários à autoaceitação.

A autoaceitação incondicional significa exatamente o que parece significar: que o indivíduo se aceita completamente a si mesmo, a sua existência, a seu ser, a sua vivacidade, sem qualquer tipo de restrição ou condição. Por outro lado, o que normalmente chamamos de “autoconfiança” ou “autoestima” são conceitos altamente condicionados de aceitação. Pois se você confia em si mesmo ou estima-se a si mesmo invariavelmente o fará por alguma razão, porque faz algo bem. E se esse é o caso, então você imediatamente perderá essa confiança ou estima assim que começar a fazer coisas mal feitas. “Eu sou bom não porque eu faça algo bem feito ou porque eu seja amado pelos outros, mas pelo simples fato de que estou vivo. Minha bondade está em minha vivacidade. Ponto final.”

A autodepreciação frequentemente leva ao outro lado da moeda da insegurança pessoal: a exaltação compulsiva do ego. Se você acha que não vale nada enquanto pessoa somente porque fez coisas erradas ou mal feitas, então começará a tentar provar a si mesmo que você na verdade é, sim, uma pessoa digna e de valor; e a maneira com que fará isso é fazer coisas que supostamente inflem seu ego e dar-se tapinhas nas costas por ter feito elas.

As tentativas de inflar o ego são provavelmente os comportamentos mais destrutivos da eficiência organizacional.

 Sentimentos de hostilidade

A autoafirmação é um dos mais saudáveis objetivos no ambiente de trabalho, e um dos que mais o ajudarão a atingir (e manter) a eficiência executiva. Mas o problema é que é muito fácil confundir autoafirmação com hostilidade. Dado que a hostilidade, ou raiva, nos motiva a ser assertivos e às vezes a atingir bons resultados (ou ao menos resultados rápidos), então muita gente conclui que (1) a raiva é um elemento necessário da afirmação, (2) a raiva é uma demonstração de força, (3) a raiva é uma demonstração autêntica a respeito do que está acontecendo e (4) a raiva é altamente desejável.

A afirmação (ou assertividade) é saudável porque demonstra que você quer algo e que está determinado a fazer alguma coisa para obter esse algo, mesmo que algumas pessoas pensem diferente e queiram que você faça o que elas querem.

Mas a hostilidade é algo completamente diferente. A hostilidade não é apenas batalhar pelo que você quer; é depreciar, enquanto ser humano, àqueles que querem algo diferente de você.

 Depressão

Será que a sensibilidade racional ensina às pessoas que elas nunca, jamais, devem sentir-se deprimidas – nem mesmo quando alguém querido morrer ou quando uma empresa entrar em falência? Sim, é exatamente isso que ela ensina. Pois a depressão, quando corretamente definida, não significa apenas tristeza profunda, infelicidade ou luto; depressão significa também autodepreciação, autopiedade e um sentimento de total desesperança.

Pois sentir-se frustrado, contrariado, chateado, tudo isso naturalmente o encoraja a sentir-se triste e cabisbaixo. Mas sentir-se deprimido, desesperado, completamente melancólico, significa, acima de tudo, que você está torturando-se a si mesmo por ser torturado, que está exigindo e fazendo birrinha porque o mundo deveria ser arrumado de tal forma que você nunca seja frustrado, contrariado e chateado.

Quase todos os transtornos de personalidade resultam do mecanismo de culpa irrealista e exagerada – culpar a si mesmo, os outros, o mundo. Quando se comporta neuroticamente você flagela pessoas e coisas de maneira supergeneralizada somente porque algumas características delas são indesejadas. Ao invés de querer, desejar e preferir que essas pessoas e coisas tenham características melhores, você exige e ordena que elas melhorem completa e imediatamente.

Fonte: Albert Ellis, Executive Leadership, Institute for Rational Living, Nova York, NY, EUA, 1972.