Phótios Kóntoglou
Hoje em dia, presenciamos o surgimento de muitas religiões que representam os céticos e os ateus. Uma delas é o turismo, fruto da curiosidade mórbida das pessoas que querem xeretar e descobrir, mas sem dar a mais mínima importância para aquilo que vêem ou ouvem. A maioria dos turistas é composta de gente entediada com suas próprias vidas e que querem passar seu tempo sem se importar com os monumentos ou com as lições de história que os guias lhes contam, os quais agem como se estivessem preparando um banquete para pessoas que sofrem de anorexia. Tudo o que o guia lhes diz entra por um ouvido e sai pelo outro.
Porém, quem tem coragem de rejeitar essa nova divindade que é a indústria do turismo, que traz consigo um grande dote? Pois hoje em dia as coisas que trazem dinheiro são santas. Como você se atreve a falar mal dessas coisas? Você insultou Maomé, você insultou Mamon.
Como se não bastasse o turismo entupir os museus com gente de todas as raças, de folders em mãos e câmeras pendurada nos ombros, e como se não bastasse toda e qualquer montanha isolada que tenha duas colunas quebradas ou pedaços de mármore esculpidos ser emporcalhada, e como se não bastasse que nenhum mistério das civilizações antigas reste oculto, que nenhuma tumba não tenha sido aberta para que turistas exaustos pudessem olhar, eles também entram nas igrejas e em capelas remotas, onde nosso povo reza, e ficam ali, com as mãos cruzadas para trás, sem fazer o sinal da Cruz, sem se perguntar o que essa gente infeliz está fazendo ali de pé ou onde estão.
O turismo tomou conta de tudo. Em sua presença real, todas as portas têm de estar abertas para recebê-lo, portas de castelos que jamais foram conquistados por guerreiro algum, portas de mosteiros que permaneceram trancadas por milhares de anos, celas, cavernas e eremitérios nos quais homens santos viveram em reclusão. Altares, cestos para o santo pão, taças de comunhão, relicários: tudo é despudoradamente trazido a público para que turistas possam vê-los.
Por fim, a maior fortaleza da Ortodoxia, o Monte Atos, a Santa Montanha, também se rendeu ao turismo. No jardim da Virgem Maria que é o Monte Atos, onde, por sua vontade, nenhuma presença feminina, seja humana ou animal, jamais pisou, agora é freqüentado por milhares de homens de todas as raças, alguns de cigarro na boca, outros com calças apertadas, outros semi-nus, tagarelando, rindo, pois estão indo para se divertir, para fugir de seus trabalhos tediosos, de seus negócios, da tecnologia, dos trens, dos aviões, dos navios, dos carros, teatros, saunas, hotéis e tudo o que lhes cerca quando retornarem a seus países. Mas, mesmo quando estão aqui, carregam consigo o cheiro fétido dessas coisas, incapazes que são de sentir qualquer coisa, incapazes de qualquer contrição, totalmente alienados dos antigos mistérios ocultos da Santa Montanha.
Ora, como é possível transmitir fragrância espiritual a quem não tem olfato espiritual? Como podem sentir o que vêem e ouvem se essas coisas são frutos supersubstanciais e revelações de misericórdia, de oração, de teoria divina? Não que essas pessoas sejam culpadas -- algumas são inocentes e humildes --, mas estão tão distantes das condições de entender que este não é um lugar para recreio, para caminhadas, para se divertirem, nem mesmo para aprenderem, mas um lugar que carrega sobre si esta inscrição: "Este é um lugar de respeito! Não sou nada menos do que a casa de Deus e os portões do céu". Essa gente infeliz não sabe o que vê e ouve, pois estas não são coisas que se possam compreender mentalmente. Como poderiam supor que nem mesmo seus guias são capazes de perceber o verdadeiro significado, e que, apesar do conhecimento que possuem sobre as coisas santas, trata-se de um conhecimento superficial, mecânico, insípido, pois "a relação com Deus só se dá mediante a memória espiritual, as bênçãos da oração e o sacrifício".
Este não é o lugar para se encontrar respostas à mórbida curiosidade humana, mas um lugar onde as pessoas esquecem o mundo, onde se esforçam espiritualmente, com o sofrimento do corpo, entregando-se completamente nas mãos de Deus, com jejuns, com as mãos erguidas ao céu, caladas por anos a fio, com seus corações fechados a todo e qualquer contato exterior. É apenas por acaso que vocês, turistas, chegam aqui. O objetivo de vocês é agradar a seus sentidos e corpos, mas aqui, onde seus guias lhes trouxeram, é um local de alegria enlutada, onde ninguém que tenha morado ou ainda more aqui vai lhes alegrar, pois aqui eles vivem com dor no coração, aquecidos pelo calor do zelo pela salvação de suas almas. Como se atrevem a vir aqui, como se estivessem vindo a uma festa de casamento, quando este é um lugar de lembrança constante da morte, um chamado triste a Deus?
Os inimigos de nossa religião e de nossa nação são mais perigosos do que os velhos inimigos, pois eles agem de maneira dissimulada, aparentemente pacífica, parecendo inocentes e incapazes de fazer qualquer mal. Refiro-me precisamente às chamadas "benesses da civilização moderna", às facilidades que tornam a vida mais fácil e que são, na verdade, armadilhas venenosas, refiro-me aos espetáculos, às diversas formas de entretenimento, ao turismo etc. Estes inimigos parecem inocentes, incapazes de nos fazer mal, pois não se apresentam como selvagens e não revelam suas intenções sub-reptícias, pois mal são notados. Dos inimigos conseguimos nos proteger, mas não desses novos inimigos, como procurarei ilustrar na seguinte história:
Era uma vez uma mamãe-polvo, que descansava tranqüilamente no fundo do mar com seu filho. Um dia, o polvinho foi fisgado e começou a ser levado para cima. Ele começou a gritar por sua mãe: "Eles me pegaram, mamãe!" Ela lhe garantiu: "Não se preocupe, filho!" O polvinho começou a gritar de novo: "Eles estão me tirando da água, mamãe!" "Não se preocupe, meu filho!" -- "Eles estão me fritando, mamãe!" -- "Não se preocupe, meu filho!" -- "Eles estão me cortando com uma faca!" -- "Não se preocupe!" -- "Eles estão me colocando em uma panela quente!" -- "Não se preocupe!" -- "Eles estão me comendo, eles estão me mastigando!" -- "Não se preocupe, meu filho!" -- "Eles estão me engolindo!" -- "Não se preocupe!" -- "Eles estão bebendo vinho, mamãe!" "Oh! Eu te perdi, meu filho!"
A moral da história é que todas as aflições sofridas pelo polvo não chegaram a matá-lo: fisgar, fritar, cozinhar, mastigar, nada disso o matou. Mas quando a mãe ouviu que as pessoas que o capturaram e comeram estavam bebendo vinho para digeri-lo, clamou: "Eu te perdi, meu filho!" O vinho, que à primeira vista é a coisa mais suave da história em comparação com a faca e a mastigação, é na realidade o maior inimigo do polvo.
É exatamente assim que as coisas se passam com nós, gregos. Muitos turbilhões já passaram por nossa terra, toda sorte de gente selvagem, assassinos impiedosos, espadas, lanças, todo tipo de arma. Persas, germânicos, francos, árabes, turcos e outros. Eles mataram, cortaram em pedaços, enforcaram, cozinharam em espetos, mas não morremos, pois a luta nos deixou mais fortes, sólidos como o aço, e combatemos o fogo com o fogo. Mas hoje em dia, os inimigos mudaram de aparência, tornaram-se sub-reptícios, risonhos, são falsos amigos, pois parecem inofensivos e até mesmo benfeitores, cheios de boas intenções. São essas as benesses que acompanham os dispositivos tecnológicos, as máquinas de lavar, os aviões, cinema, rádio, nudez e tudo o mais que nos paralisa, que tira de nós a religião, a tradição, a família, tudo o que é realmente importante.
Uma dessas benesses sub-reptícias é o turismo, o vinho inocente que mata o polvo, que não é nem faca, nem dente.
Fonte: NOCTOC
Foto: Metropolitan Museum of Art, Nova York, EUA.