De modo
geral, o estado de saúde, o sono, a alimentação, a temperatura, as condições climáticas,
o ambiente e muitas outras circunstâncias exteriores exercem uma influência
poderosa sobre a nossa disposição, e esta sobre os nossos pensamentos. Como consequência,
nossa visão de uma questão qualquer, bem como nossa capacidade de produzir
alguma coisa estão intensamente submetidas ao tempo e mesmo ao lugar. Portanto:
Aproveita a
disposição verdadeira,
Pois ela
chega raramente.
Goethe (“Generalbeichte”) [“Confissao
geral”]
Não é
apenas em relação às concepções objetivas e aos pensamentos originais que temos
de esperar se lhes agrada vir e quando. Mesmo a ponderação profunda de uma questão
pessoal nem sempre dá seus resultados no tempo que estabelecemos com antecedência
e para o qual nos preparamos. Ao contrário, a ponderação profunda também escolhe
o seu tempo, e então a sequência dos pensamentos que se ajusta a ela se
desenvolve espontaneamente e nós a seguimos com inteira atenção.
Para tomar
as rédeas à fantasia, como recomendado acima, também é preciso impedir que ela
evoque e ilustre as injustiças outrora sofridas, bem como os danos, as perdas,
as injúrias, as preterições, as humilhações e coisas semelhantes. Do contrário,
excitamos novamente a indignação, a cólera e todas as paixões odiáveis, há
muito tempo adormecidas, que contaminam nossa alma. Pois, segundo uma bela comparação
do neoplatônico Proclo, assim como em cada cidade, ao lado dos nobres e
distintos, mora também o populacho de todo tipo, também em cada homem, mesmo o
mais nobre e mais sublime, existem, segundo a sua disposição, os elementos mais
diminutos e comuns da natureza humana e mesmo animal. Esse populacho não deve
ser excitado ao tumulto, nem deve ter a permissão de olhar pela janela, pois
sua aparência é deveras feia. Ora, esses produtos da fantasia que acabamos de
descrever são os demagogos desse populacho. Além disso, a menor contrariedade,
advinda seja dos homens ou das coisas, se for constantemente cogitada e
repintada com cores vivas e segundo uma escala ampliada, pode transformar-se
num monstro que nos coloca fora de controle. Devemos, antes, encarar de maneira
bem prosaica e sóbria tudo o que for desagradável, para assim aceitarmos o que
nos couber da maneira mais fácil possível.
Do mesmo
modo como os objetos pequenos, mantidos na proximidade dos olhos, limitam o
nosso campo de visão, encobrindo o mundo, também os homens e as coisas da nossa
vizinhança mais imediata, por mais insignificantes e indiferentes que sejam, ocuparão
com frequência a nossa atenção e nossos pensamentos para além do necessário, e
muitas vezes de modo desagradável, reprimindo pensamentos e questões importantes.
É preciso reagir contra isso.
Fonte:
Arthur Schopenhauer, The Wisdom of Life and Cousels and Maxims, Pantianos
Classics.